Cinco vezes flagrado a 150km/h, e tudo bem?

Cinco vezes flagrado a 150km/h, e tudo bem?

Por Enio Bacci, diretor-geral do DetranRS

As mudanças no Código de Trânsito Brasileiro propostas pelo presidente Bolsonaro deixaram a comunidade do trânsito perplexa. Alguns tópicos do projeto nos causam especial apreensão, como o aumento do número de pontos para suspender a Carteira Nacional de Habilitação.

Pelo novo texto, o condutor poderá cometer cinco infrações gravíssimas ou até sete graves sem punição além da multa. Um condutor poderá ser flagrado cinco vezes a 150 km/h na BR-101, BR386 ou qualquer outra rodovia onde o limite é 100km/h, e nem mesmo será submetido a uma reciclagem. Poderá ser flagrado cinco vezes na contramão na Freeway e não terá consequência maior na sua vida como motorista. Alguns argumentam que esses motoristas já estarão sendo punidos com a multa e que seria exagero deixar uma pessoa sem carteira, muitas vezes, sem poder exercer sua profissão.

Mas o sistema de pontos, especialmente em um país desigual como o Brasil, tem um papel importantíssimo como complementar a penalidade. Principalmente porque o motorista suspenso deve passar por um processo de reciclagem, que prevê 30h de curso, onde será submetido a uma atualização de seus conhecimentos sobre trânsito ao mesmo tempo que será sensibilizado para mudar sua conduta ao volante. Entre salvar a vida e salvar a carteira, optamos pela vida. O sistema de pontuação para motoristas é recomendado pela ONU. A legislação de trânsito do Brasil está em consonância com essa recomendação e é uma das mais avançadas do mundo.

Dobrar a tolerância para aqueles que transgridem as regras que garantem a segurança de todos no trânsito não encontra guarida em nenhum estudo e nenhum manual no mundo. Faltou para o governo ouvir os técnicos. Para fazer qualquer mudança em uma área delicada como o trânsito, o mínimo que se pode fazer é conhecer as consequências. Para isso, é preciso ouvir quem trabalha uma vida inteira para evitar mortes. Estamos apostando no diálogo com o Parlamento. Que deputados e senadores façam essa escuta que faltou ao governo e ajudem-nos a evitar tragédias desnecessárias. Não se trata de questão ideológica entre governo e oposição, mas entre vidas e mortes.

Artigo publicado no portal GaúchaZH, em 13/06/19.

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